
A primeira pedra
Ainda bem que não sou assessor de coisa nenhuma, nem bicheiro, autoridade ou político. Passei o Carnaval em paz, sem necessidade de articular ou desarticular os próximos lances da vida nacional.
Ainda bem que não sou assessor de coisa nenhuma, nem bicheiro, autoridade ou político. Passei o Carnaval em paz, sem necessidade de articular ou desarticular os próximos lances da vida nacional.
Eu não esperava te encontrar aqui. Tu não sai da cidade no carnaval?
Os que apostaram na transitoriedade da obra de Gilberto Freyre fizeram um mal negócio crítico. As reedições dos seus livros clássicos, e as edições quase inesperadas de textos inéditos ou talvez extraviados, apontam em direção oposta. Agora mesmo a Global Editora vem de lançar, em cuidadoso volume comemorativo dos seus 70 anos, nova edição do Casa-grande & senzala. A Editora da Universidade de Brasília, com a Imprensa Oficial de São Paulo, também entrega ao público de Gilberto Freyre quatro volumes certamente inesperados: Palavras repatriadas, China tropical, Americanidade e latinidade da América Latina e outros textos afins, e Três histórias mais ou menos inventadas. Eles foram reunidos e anotados por ninguém mais, ninguém menos, do que o qualificado gilbertiano Edison Nery da Fonseca. O quarto volume, de narrativas provavelmente desconhecidas, conta com inteligentes prefácio e posfácio do poeta e ensaísta César Leal.
O Carnaval passa ao largo do mercado e da globalização, pois não depende deles. Se os bolsos ficarem vazios é a Bolsa que fica ameaçada. Carnaval não influencia a taxa de juros, não a baixa nem a sobe. Assim, nada de preocupações; que seja a alegria.
Não me incluo entre os devotos de Mário de Andrade, mas considero sua melhor obra, "Macunaíma", um dos dez livros mais importantes da nossa literatura, indispensável ao conhecimento de nossa alma cultural e social.
Quando o poeta Gerardo Mello Mourão regressou de Pequim, onde passou dois anos na condição de correspondente da Folha de S. Paulo, os amigos cobraram dele um livro sobre a China. Com a sabedoria de um mandarim cearense, ele respondeu que, se um jornalista brasileiro vai à China e passa uma semana, na volta escreve um livro. Quando a viagem dura um mês, o sujeito desconfia que há um mundo para ele desconhecido e então só escreve um artigo. Mas se a permanência for de dois anos, no regresso ele não escreve nada; em dois anos dá para perceber que para explicar o planeta China é indispensável viver lá pelo menos dez.
A beleza do idioma de Portugal e do Brasil teve pouquíssimos cultores que a realçassem com o amor, a competência, o conhecimento da matéria e a constância de Laudelino Freire. À língua portuguesa dedicou ele o seu tempo de vida, a sua inteligência, o seu bom gosto, o seu senso de ritmo. Servia a ela, com a inteireza de um apaixonado lúcido.
Jacques Chirac apoiou a criação do “Fundo Lula”, iniciativa inédita de potência do primeiro mundo, acolhendo a proposta de décadas das periferias. Amadureceu, sobre outras bases, a idéia da taxa Tobin, de extrair percentos da abastança dos ricos em favor da mudança social dos países desmunidos. O alvo é o comércio de armamentos e o presidente francês não deixou dúvida quanto ao impacto da garfada, já que a sua nação é a terceira exportadora mundial deste produto. A atitude marca um novo protagonismo da velha Europa, a partir de Paris. Acompanha o racha começado contra a guerra no Iraque, tornado nítido na Conferência de Evian, no ano passado - onde o presidente Bush compareceu entre duas portas giratórias.
A universidade brasileira mal chegou aos 80 anos de conturbada existência. Ela deve competir com outras, em diferentes partes do mundo, que têm cinco ou seis séculos. Tradição pesa - e muito - nesse caso.
Depois de minha extenuante temporada na Denodada Vila de Itaparica, eis-me de volta ao Rio de Janeiro, entre os confortos e encantos da cidade grande. A readaptação tem exigido algum empenho, mas nada que umas duas dúzias de tranqüilizantes não resolvam, até porque as novidades são escassas. Tudo parece continuar na rotina de sempre. O assalto da semana, como de hábito escolhido em votação democrática pela minha turma de boteco, não chegou a empolgar e terminou na patética condição de apenas mais um item obscuro da pauta. Parece faltar criatividade aos assaltantes, que correm o risco de desgaste junto ao consumidor. A continuar assim, logo os modelos hoje em prática sairão da moda e serão varridos pelas aceleradas mudanças atuais, ninguém agüenta mais essa mesmice.
A maior crítica que faço ao Ministério da Educação e ao Conselho Nacional de Educação é a criação inexplicável de precários estabelecimentos de ensino superior e de universidades fajutas nestes últimos anos, elevando-se para 544 o número dessas entidades entre novembro de 2001 e julho de 2003.
Como os paulistas, tenho as minhas nostalgias nestes 450 anos de São Paulo. Vi a cidade, pela primeira vez, em 1950, no Congresso da UNE, realizado no auditório do Hospital das Clínicas, quando os arranha-céus pipocavam e a velha vila de Piratininga procurava evitar sua morte nos espaços que se escondiam nos velhos bairros. Tive minhas noitadas de estudante na Major Sertório e experimentei o fascínio da visão vertical nos miradouros do alto dos prédios.Na minha cabeça estava a poesia do São Paulo da garoa, os versos da Paulicéia Desvairada de Mário de Andrade, memorizados quase todos.
Vem-nos agora, com o interesse, aplauso e espanto em todo o Brasil, a iniciativa da OAB de recomendar, ou não, os atuais cursos jurídicos do País. Trata-se de aplicar o dito selo de qualidade, instalando na área universitária a informação ao consumidor como sugerem os incentivos, urbi et orbe, da produtividade capitalista. Não se trata, pois, de definir aprovados e reprovados, como propagou a mídia, qual passagens para o paraíso ou o inferno das nossas faculdades. O martelo da Ordem privilegiou 69 unidades entre 248 casas de ensino. Mas nada foi dito quanto aos critérios do selo. Que bases, que amostragens, que eixos comparativos usou a Ordem, entre as 248 casas de ensino submetidas ao seu olhar e ao seu cutelo?
Há um mundão de piadas sobre equívocos sociais que todos cometemos, uns mais, outros menos. Trocar nomes ou ofícios de pessoas talvez seja o mais comum, criando embaraços para as duas pontas em questão. Bem verdade que há sempre um jeito de consertar as coisas, educadamente, aliviando o inicial constrangimento provocado pelo engano de pessoa ou de ofício.
A Academia Brasileira de Letras desfraldou recentemente uma nobre bandeira: a da defesa da língua portuguesa. A verdade é que ela está correndo sérios riscos, desde quando, nos currículos escolares, foram extintas disciplinas que enriqueciam a cultura dos nossos estudantes.Assim, primeiro foi a vez do latim, que é a nossa origem e a nossa matriz. Depois, riscado o ensino do idioma francês. Agora, estão abolindo o ensino da Literatura. Já existem gramáticas, e até mesmo professores, que estão cortando a segunda pessoa do singular e do plural - o tu e o vós - na conjugação de alguns verbos.