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Rumo à eternidade

 

A presença de Lêdo Ivo entre nós sempre foi alvoroçada. Quando chegava invariavelmente às sessões, não precisava ser anunciado. Sua voz tonitroava desde os elevadores.  Ativo e bem  disposto, até os 88  anos de idade, não parou de produzir um  só instante.  Para Carlos Heitor Cony, foi o melhor dos nossos sonetistas.
                                            
Ultimamente, fazia  viagens sucessivas. Eram preciosos contatos internacionais, de que muito se valeu a Academia Brasileira de Letras.  Como buscava a luz do alto da colina, como afirmou num dos seus textos, não foi surpresa achar suas obras em diversas e importantes bibliotecas do mundo, como pessoalmente encontramos o clássico “Ninho de cobras” na conceituada Academia Sueca.
                                             
Desde a infância, nas Alagoas, desejou ser poeta e escritor.  Acrescentou já no Rio a condição de combativo jornalista da “Tribuna da Imprensa” e da “Manchete”, onde vivemos muitos anos de proveitoso convívio.  Uma particularidade:  tinha especial vocação para dar títulos inteligentes e originais às matérias que lhes caíam nas mãos.  Sempre  foi muito  requisitado.
                                           
Orgulhava-se de ter nascido em Maceió: “Diante de mim estava sempre o mar, com as suas vagas sucessivas, os navios que convidavam à partida e à evasão... Desde cedo aprendi que a única verdade do homem é a verdade da sua imaginação, esteja ela guiando a mão de um escritor ou a ambição de um menino.”
                                           
Foi na capital alagoana que vibrou ao  sentar num bar ao lado de Rachel de Queiroz, com outros escritores clássicos, como José Lins do Rego, Graciliano Ramos e Jorge de Lima, este último o príncipe local dos poetas parnasianos, graças ao famoso soneto “O acendedor de lampiões” – para depois se render ao Modernismo e escrever o inolvidável “Essa nega fulô.”
                                         
Depois Lêdo estudou no Recife, onde encantou-se  com o Romantismo.  Chegou a Rimbaud, Baudelaire, Mallarmé, Verlaine, seguidos por Rilke e T.S.Eliot.  Foi a origem do seu interesse pela famosa geração de 45, que surgiu contrapondo-se ao Modernismo então vigente e que se caracterizava pelo seu formalismo e cerebralismo.  Assim se fortaleceu o escritor e poeta, dando vazão ao seu “tesouro pessoal”.  Não se tornou um poeta derramado, pois para ele escrever não é cortar palavras, é acreditar.
                                         
Pode-se afirmar que Lêdo Ivo foi um poeta para o qual  a criação não era um suplício, mas um prazer e uma felicidade.  Sua voz, empenhada na celebração do mundo e na reflexão sobre a condição humana, era primeiro ouvida em casa, na companhia da sua adorável Maria Lêda, minha colega de magistério na Cândido Mendes, e seus filhos não menos queridos.
                                        
Realizou uma ininterrupta viagem em torno de si mesmo e converteu a sua noite num amanhecer.  Foi assim que chegou a Sevilha, na Espanha, longe de imaginar que ali, em companhia da família, daria o seu adeus silencioso, rumo  à eternidade.

                                          
Jornal do Commercio, 18/1/2013