
Protestos e confrontos
Impressionantes as imagens que nos chegaram da Espanha, com multidões nas ruas condenando atos terroristas em geral e em particular o atentado da semana passada.
Impressionantes as imagens que nos chegaram da Espanha, com multidões nas ruas condenando atos terroristas em geral e em particular o atentado da semana passada.
Um passageiro de ônibus, acompanhado da mulher, desceu do veículo pela porta adequada e sem motivo algum, sem nada que o provocasse ou provocasse a sua ira, saca do revolver, que tinha no coldre sem autorização da polícia, e atira no pobre motorista, que estava cumprindo o seu dever, para ganhar o modesto salário com que deve sustentar a família, educar os filhos e ter algum lazer. Crime estúpido, como todos os crimes que se registram na capital.
O atentado na Espanha trouxe um ingrediente novo à luta contra o terror. O "day after" ainda não passou, mas já se percebe algum interesse do governo local em atribuir o ato terrorista ao ETA, enquanto a maioria dos observadores internacionais coloca a chacina de 11 de março como etapa da guerra iniciada em 11 de setembro de 2001. Há suspeita de manipulação política nas informações.
Foi um bando de fantasmas. Ninguém sabe, nem descobre antes do desastre que seus membros vão atacar, pouco se importando com o valor da vida humana. Estão sedentos de sangue, querem amedrontar a população, e o conseguem, e acabam fornecendo aos órgãos de comunicação de massa os clichês de que eles necessitam para impressionar leitores e áudio espectadores. Quem viu a primeira página dos jornais de sexta-feira tem a imagem terrível do desprezo pela vida dos condenados pelo terror.
Como alguns de vocês sabem, cheguei a iniciar a carreira de sexólogo, por causa de um livro que escrevi. Muito mais comumente do que se pensa, há leitores que não conseguem acreditar que se escreva sobre algo que nunca se experimentou. Volta e meia fica difícil conversar com eles. Uma vez, questionado sobre uma cena de parto contida em outro livro, encontrei dificuldade em provar que nunca tive um filho, digamos, pessoalmente - e até agora não estou seguro de que me dei bem. O interlocutor não pareceu muito convencido de que o famoso lado feminino de que hoje todos os homens têm de se orgulhar e manter com afinco, não era tão radicalmente desenvolvido em mim. O bigode, a careca e a voz grossa não se revelaram suficientes para tornar incontestáveis meus argumentos, pois, ao que tudo indicava, ele conhecia algumas boas mães de família com tudo isso e talvez mais alguma coisa. Suspeito que devo ter uma reputação meio estranha em certos círculos.
Olho para o lado: pelo que acabo de escutar no rádio, são aproximadamente 5.000 caminhões parados na fronteira entre a França e a Espanha, devido a uma violenta e inesperada tempestade de neve. Foi ótimo ter recebido o telefonema de uma amiga, Ruth de Aquino, que fizera este mesmo percurso no dia anterior: ela me avisava que devia evitar a todo custo aquilo que seria o caminho mais rápido para cruzar as montanhas dos Pirineus. Agora estou em uma pequena estrada lateral, que avança lentamente - mas que avança.
Foi pelo menos oportuna a publicação nesta página (28/2) de meu artigo sobre "o primado dos valores antropológicos", porque, à vista das duas cartas de leitores contrários às minhas idéias, ficamos sabendo em que se baseiam os partidários do "fundamentalismo ecológico" de alguns mentores de nosso Ministério Público ao impugnarem, a pretexto de salvaguarda do meio ambiente, obras públicas e privadas que visam atender a iniciativas de inegável interesse público.
Muitas pessoas me perguntam quanto tempo se leva para escrever um artigo. Digo que depende. Primeiro, o tempo de procurar o tema que muitas vezes está à nossa frente, bem no nariz, e a gente não enxerga. Ele se esconde, e a procura é angustiante. Depois, há o tempo de falta mesmo de assunto, de vacas magras de fatos que esperam tratamento jornalístico. O cotidiano de jornal exige texto imediato. Sofrimento mesmo vive o cronista de cada dia, esse que tem de garimpar em pedra dura; e, se faz jornalismo de declaração, sem esta, tem que se socorrer da invenção e arriscar-se a suposições e versões.
Cito o poema de Carlos Drummond de Andrade. Mundo, vasto mundo, se eu não me chamasse Raymundo, seria uma rima mas não seria uma solução . Se consultarmos o manual de Valentim Magalhães sobre rimas, encontraremos todas as rimas em língua portuguesa de que necessitarmos, mas, uma vez usada essa jóia da poesia, podemos não ter a solução de que precisávamos e termos de procurar outra solução.
Pescava em cima de umas pedras que estavam dentro do lago. Olhou para trás e viu que a mulher o observava. O céu era cinzento, ameaçava chuva, a região deserta. Olharam-se nos olhos, a mulher falou qualquer coisa que o encorajasse - o que não foi preciso. Havia um atalho, penetraram no pequeno bosque de bambus - havia muitos ali. Amaram-se sem esforço.
Ainda bem que há gosto para tudo. Um milionário americano passou uns dias aqui no Rio, trazendo no bolso um iate que é maior do que um couraçado-de-bolso da 2ª Guerra Mundial. No bolso do milionário ainda sobraria espaço para iates tão colossais que poderiam comportar o Taj Mahal, a basílica de São Pedro, de Roma, e o Maracanã inteiro, com lotação esgotada.
No jornal Valor Econômico, editado por nossos confrades da Folha e de O Globo, vem estampada uma notícia, segundo a qual, como fez saber o chanceler Celso Amorim, o Brasil, a África do Sul e a Índia decidiram estimular a aproximação entre os empresários dos três países para fomentar o acordo de cooperação política e econômica. Não poderia ser mais auspiciosa a notícia de procedência oficial, essa que vai fortalecer o comércio de países dele necessitados.
Toda vez que estoura um escândalo, real ou não, os interessados se esforçam em desviar a atenção da sociedade, procurando saber quem e por que divulgou a tramóia, pondo o escândalo em plano secundário e até mesmo esquecido.
Durante pelo menos duas décadas a máquina Rolleyflex foi a vedete das coberturas jornalísticas. Nos anos 60 e 70, quando as maiores revistas semanais do país eram a Manchete e O Cruzeiro, os fotógrafos empunhavam essa máquina, pesada e precisa, para as suas coberturas históricas. Forneciam as imagens necessárias para as grandes reportagens de David Nasser, Luiz Carlos Barreto, Jean Manzon, Joel Silveira, Murilo Mello Filho, Fernando Pinto etc. Foi com uma delas que Marcelo Escobar e José Avelino perderam a vida, na tentativa de cobrir as misteriosas ações de traficantes, em Santa Cruz de la Sierra, na Bolívia. O trem virou, havia muita gente, mas só morreram os dois jornalistas da Manchete. Estranha coincidência.
Foi na palavra e com a palavra que o bicho homem saiu de sua normal animalidade para pensar e analisar o mundo que o circundava. Desde o começo da linguagem falada, a palavra entrou na memória e criou um signo específico para ajudar na preservação de coisas antigas. Na base de tudo estava ela, como ainda está. Quanto mais a quantidade real de palavras possamos ter armazenado, estaremos aprendendo a raciocinar e argumentar com mais clareza.