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Enfim, a reforma

 

A Frente Parlamentar Mista da Reforma Administrativa aguarda a remessa da reforma pelo governo, prometida para hoje, para dar concretude às diversas propostas que já estão em discussão. O senador Antonio Anastasia, vice-presidente da Frente, que é presidida pelo deputado Tiago Mitraud, considera que, entre os temas mais importantes, o principal é a questão do vínculo jurídico dos servidores, com o fim da universalidade do regime único, a permissão de contratação por outros regimes jurídicos, que precisa de mudança constitucional.

Significaria mudança da estabilidade, eventual mudança de tipos de concursos públicos, permitiria também tornar ainda mais explícita a questão do teto remuneratório, das vantagens, e dar diretrizes gerais sobre as carreiras.

A proposta do governo deve ir ao encontro do que pensam os membros da Frente, permitindo que novos concursados sejam contratados sem previsão de estabilidade, com exceção das chamadas “carreiras de Estado”, como diplomatas. Hoje, a Constituição prevê que todos os servidores se tornam estáveis após um “estágio probatório” de três anos.

O senador mineiro acha que esse estágio hoje é “uma ficção”, e a proposta do governo deve conter um período de mais sete anos para os servidores públicos ganharem estabilidade. A Frente Parlamentar Mista da Reforma Administrativa acha que, em se tratando de organização, é preciso dar mais flexibilidade, especialmente ao Executivo, desde que não se criem despesas.

O senador Anastasia lembra que, no ano passado, “ficamos aqui no Congresso discutindo se o Coaf é do Ministerio da Justiça ou da Fazenda. Não é matéria de lei, o órgão não está sendo criado, no mundo todo, o Executivo decide onde deve alocar”.

Além de temas que necessitarão de emendas constitucionais, Anastasia lembra que vai ser preciso também “uma infinidade de leis que vão tratar de avaliação de desempenho, remuneração variável, a questão das carreiras, valor de ingresso, forma de progressão”.

Os membros da Frente temiam que não viesse nada sobre a reforma administrativa este ano e consideram que o provável envio de uma proposta de emenda constitucional (PEC) “já é um bom início, o assunto começa a ser debatido”. Ao contrário das reformas tributária e previdenciária, que se exaurem praticamente numa lei só, o senador Antonio Anastasia diz que, no caso da administrativa, “é um processo dinâmico”.

O Brasil ficou muito tempo parado, com as corporações impedindo alterações. Exemplo disso é a lei do teto remuneratório, que foi votada no Senado em 2016 e está na Câmara parada até hoje.

O senador Anastasia acha que o ministro da Economia, Paulo Guedes, “foi sábio, política e tecnicamente” ao destacar que a reforma administrativa não atinge os atuais servidores, mas abre uma perspectiva de futuro. Assim, “não vai ter contra si os funcionários públicos. Muitas vezes a pessoa é contra sem nem saber o que é. A reforma administrativa é a favor dos bons funcionários, que são a maioria. Ela é contra os abusos, as desigualdades, privilégios”.

Sobre as críticas de que a reforma deveria atingir o sistema atual, Anastasia lembra que “colocando daqui para a frente, evita a questão do direito adquirido, evita questões judiciais, não fere nada de ninguém”. Se tivéssemos feito isso 20 anos atrás, hoje estaríamos muito melhor, ressalta.

Outra área que precisa entrar na reforma são as agências reguladoras, nascidas de uma boa ideia no governo Fernando Henrique Cardoso que foi “violentada”, segundo Anastasia. “As agências foram cooptadas por uma estrutura política, infelizmente.”

A Frente Mista defende uma agência nova, concebida para formar servidores de uma boa gestão pública. O senador Antonio Anastasia lembra o papel do Dasp (Departamento Administrativo do Serviço Público), “que, de 1938 a 1985, foi uma referência nacional de alta qualificação técnica. Nada foi colocado no lugar quando foi extinto, e esse tema da gestão pública ficou órfão, não tivemos uma cultura consolidada”.

Pelo conceito da Frente Mista, temos que criar uma agência técnica, com gente preparada, blindada da política, como vários países têm, exatamente para dar as diretrizes do serviço público brasileiro. “Temos que formar quadros, fazer avaliação, critérios de participação social, atuação cidadã.”

O Globo, 03/09/2020