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Jorge Amado, o romancista do amor

 

O escritor que redescobriu a Bahia

O GLOBO (07.08.2001 / 11.08.2001)

11.08.2001

No dia em que o escritor jorge Amado completaria 89 anos, a família cumpriu seu último desejo. Ontem, foi enterrada a urna com suas cinzas sob a sombra da mangueira que ele e a mulher, Zélia Gattai, plantaram no jardim da casa onde viveram por mais de 40 anos, em Salvador.

 

09.08.2001

SALVADOR. O corpo do escritor Jorge Amado foi cremado ontem, ao meio-dia, no Cemitério Jardim da Saudade. Parentes e amigos participaram da cerimônia. As cinzas serão entregues hoje à família e serão jogadas no pé da mangueira que o escritor e sua mulher, Zélia Gattai, plantaram no quintal da casa do Rio Vermelho, onde viveram por mais de 40 anos.

 

08.08.2001

A Bahia se une na despedida a Jorge Amado

Waldomiro Júnior


SALVADOR. Cada canto da Bahia chorou ontem a morte de Jorge Amado. Nas ruas de Salvador, estudantes se pintaram de preto e a tristeza tomou conta das baianas de acarajé. Mais de três mil pessoas foram ao Palácio da Aclamação para o velório do escritor, que reuniu artistas, políticos e intelectuais. A despedida foi marcada pelo sincretismo religioso, tantas vezes descrito nas obras de Jorge Amado, que pôs lado a lado o mais popular sacerdote da cidade, monsenhor Gaspar Sadock, e as mães-de-santo da Irmandade de Nossa Senhora da Boa Morte.

O corpo chegou ao palácio no fim da noite de segunda-feira, escoltado por batedores da Polícia Militar. A mulher, a também escritora Zélia Gattai, e a filha, Paloma, chegaram logo depois. A escritora beijou o marido e se juntou ao filho e aos netos para receber os amigos.

O velório só foi aberto ao público às 7h30m. Uma multidão já estava na porta. Uma fila silenciosa e que parecia interminável se formou para ver pela última vez o escritor que levou para mais de 40 países a imagem do povo da sua terra.

‘Um dos tesouros deste país’

A despedida a Jorge Amado reuniu amigos ilustres como o ex-presidente e senador José Sarney e sua filha, a governadora do Maranhão, Roseana Sarney, o ex-ministro da Educação Eduardo Portela, o cineasta Nelson Pereira dos Santos, o escritor João Ubaldo Ribeiro, a atriz Maria Zilda, o ex-senador Antonio Carlos Magalhães, a cantora Daniela Mercury e os artistas plásticos Calazans Neto e Mário Cravo.

De Cachoeira chegaram as mães-de-santo da Irmandade de Nossa Senhora da Boa Morte. As 24 mulheres ergueram o caixão e o embalaram, para que a travessia do escritor a uma nova vida seja tranqüila.

Zélia beija o marido no adeus

Às 15h30m, Zélia beijou pela última vez o marido. O caixão foi fechado e o corpo de Jorge Amado deixou o Salão Dourado do palácio sob aplausos. O caixão foi levado num carro do Corpo de Bombeiros para o crematório do Cemitério Jardim da Saudade.

- Esse caixão carrega um dos tesouros deste país - resumiu, emocionado, Sarney.

O cortejo cruzou a Avenida Juracy Magalhães, a poucos metros da casa em que o escritor e a mulher viveram por mais de 40 anos. Às 15h, chegou ao cemitério. O ministro da Cultura, Francisco Weffort, representou o presidente Fernando Henrique.

- Ele era muito amigo do presidente. Em muitos momentos os caminhos dos dois se encontraram - disse.

Zélia recebeu um abraço e um beijo de Caetano Veloso, que foi homenagear o escritor.

- A gente vai sentir muita saudade. Era muito bom tê-lo por perto. Foi a conclusão de uma vida luminosa - disse Caetano.

Muitos recordavam fatos importantes da vida que se relacionavam com algum livro de Jorge Amado.

- Decidi morar na Bahia ainda adolescente e comecei a ler seus livros - contou, chorando, a professora Maria Bernadete Gonçalves Lima, de 54 anos.

 

07.08.2001

As cores das plantações de cacau, a fé dos terreiros de candomblé, o suor dos trabalhadores do cais. Com a morte de Jorge Amado, o país perde o escritor que redescobriu a Bahia e apresentou-a ao mundo através da sensualidade de personagens como Gabriela, Teresa Batista e Dona Flor. O escritor morreu ontem no Hospital Aliança, em Salvador, aos 88 anos, vítima de complicações decorrentes da diabetes. De acordo com sua família, ele acordou bem, mas sentiu-se mal no início da noite. Levado para o hospital, sofreu uma parada cardio-respiratória às 19h30m.

O corpo será cremado hoje e as cinzas serão jogadas na mangueira do quintal de sua casa, a árvore de que o escritor mais gostava.

“O Brasil perde um de seus maiores intérpretes”, disse, à noite, o presidente Fernando Henrique Cardoso, em nota emocionada. “Os personagens que criou se tornaram tão ou mais conhecidos e reais do que seu autor. Que maior glória pode ter um escritor? A língua de Jorge Amado é um português que seduz todos os cinco sentidos, cheio de cores, sons, perfumes, sabores e texturas.”"

Jorge Amado estava em casa desde o dia 16 de julho, após internação, provocada por uma crise de hiperglicemia, que durou 26 dias.

Amado era casado com a escritora Zélia Gattai e tinha dois filhos - Paloma e João Jorge. Publicado em 46 países, traduzido em 36 idiomas, com livros adaptados para o cinema, o teatro, a televisão e o rádio no Brasil e no exterior, além de mais de 20 milhões de exemplares vendidos, Jorge Amado era o escritor mais popular e o de maior projeção internacional das letras brasileiras.

Membro da Academia Brasileira de Letras, Amado foi definido pelo crítico e ensaísta Antonio Cândido como “o maior romancista do amor, força de carne e de sangue que arrasta os seus personagens para um extraordinário clima lírico, da nossa literatura moderna”. Ainda que muitas vezes submetesse sua arte à motivação política e à intenção de uma reforma social, o escritor baiano produziu uma obra sem paralelo no cenário intelectual brasileiro.

 

14/06/2006 - Atualizada em 13/06/2006