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Faleceu Raymundo Faoro

 

Beatriz Coelho Silva e Karine Rodrigues

O Estado de São Paulo (16.05.2003)

 

Principal jurista na luta pela democratização do País e autor de obra fundamental da história política e social brasileira, Raymundo Faoro foi enterrado ontem, às 17 horas, no mausoléu da Academia Brasileira de Letras (ABL), no cemitério São João Batista, em Botafogo, zona sul do Rio, diante de cerca de cem pessoas, entre parentes e amigos. O ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos representou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Faoro morreu às 7 horas por falência múltipla dos órgãos, em decorrência de um enfizema pulmonar, no hospital Copa d'Or, em Copacabana, onde estava desde 5 de outubro.

No enterro, Thomaz Bastos ressaltou a importância de Faoro no processo de transição da ditadura para o regime democrático. E disse que o jurista "ajudou a desvendar o País" com a obra Os Donos do Poder (1958), clássico da historiografia brasileira.

Durante o velório, que durou cerca de quatro horas, no Petit Trianon, na sede da ABL, cerca de 20 acadêmicos foram prestar uma última homenagem a Faoro, que ocupou a cadeira n.º 6. Todos ressaltaram a importância de sua gestão (1977-79) na presidência da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Na ocasião, negociou o restabelecimento do habeas-corpus e a suspensão dos atos institucionais. O presidente da ABL, Alberto da Costa e Silva, disse que, com a perda de Faoro, "vai-se embora um dos últimos grandes intérpretes do Brasil".

André, 41 anos, filho mais novo de Faoro, contou que o jurista vinha sofrendo infecções pulmonares desde sua posse na ABL, em 17 de setembro, mas estava bem e animado até seu aniversário de 78 anos, em 27 de abril. "Desde então ele piorou e passou a maior parte do tempo inconsciente", contou. Além de André, o jurista deixou os filhos Antônio e Ângela e sete netos. A pedido de Faoro, uma urna com os restos mortais de sua mulher, Maria Pompéia, que morreu em 1986, foi enterrada com ele.

No início da noite, o presidente Lula, por intermédio de seu porta-voz, André Singer, também lamentou a morte de Faoro. "Além de ser um brilhante ensaísta, historiador e jurista, Faoro encarnava o espírito republicano e saudável que esse governo quer manter sempre firme", disse Singer. Lula destacou, segundo Singer, o papel desempenhado por ele na presidência da OAB, na época da redemocratização. "Além de uma obra clássica de interpretação do Brasil, Faoro deixa um exemplo de cidadania e virtude pública."

Repercussão


Presidente Luiz Inácio Lula da Silva: "Além de uma obra clássica de interpretação do Brasil, Faoro deixa um exemplo de cidadania e virtude pública."

Márcio Thomaz Bastos, ministro da Justiça: "Ele tinha o dom de ver à frente. Era um profeta. Acredito que não será facilmente substituído."

Marco Aurélio Mello, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF): "Um grande artífice do direito, homem de formação humanística insuplantável e um batalhador pelo robustecimento da cidadania."

José Paulo Sepúlveda Pertence, ministro do STF: "Tive a ventura de participar do Conselho Federal da OAB sob a presidência de Raymundo Faoro. Pude acompanhar dia a dia o papel decisivo que o notável intelectual teve naqueles momentos em que começou a pavimentar o caminho da retomada do processo democrático. O País perde um homem público da maior grandeza."

Rubens Approbato Machado, presidente nacional da OAB: "Raymundo Faoro foi defensor intransigente das liberdades violadas ou ameaçadas, porta-voz dos que estavam amordaçados pela censura e guardião dos direitos humanos. Nos anos sombrios de ditadura militar, sua atuação à frente do Conselho Federal da OAB foi marcada pela coragem. A advocacia brasileira está de luto."

Carlos Heitor Cony, jornalista e escritor: "Em uma entrevista do Faoro com Geisel, o presidente perguntou o que devia fazer e Faoro respondeu: o senhor só pode se redimir se abolir a tortura. Foi a partir daí que realmente se começou a abertura política no Brasil."

06/06/2006 - Atualizada em 05/06/2006