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Cadeira 41: Josué de Castro e a luta contra a fome

 

Josué Apolônio de Castro foi um médico e intelectual que se destacou por combater o que considerava a causa principal do atraso econômico e social do Brasil: a fome, e foi o primeiro a mostrá-la como uma questão política. Nascido no Recife, foi o primeiro brasileiro a ser indicado a um prêmio Nobel da Paz, em 1953, e outras três vezes, em 1963, 1964 e 1965. O escritor Itamar Vieira Junior fez sua tese de doutorado sobre Josué de Castro e irá analisar sua obra no ciclo Cadeira 41. “Setenta e cinco anos após a publicação de “Geografia da Fome”, os breves ensaios que compõem o livro refletem os desafios para a superação da insegurança alimentar e nutricional no Brasil do século 21”, diz ele, que se pergunta como ser concebível que um país com um território vasto, fértil e que colheu cerca de 270 milhões de toneladas de grãos na safra 2021/2022 (1,3 tonelada por habitante) possa ter índices de fome tão alarmantes?

O escritor Itamar Vieira Junior, que é também geógrafo e fez sua tese sobre Josué de Castro, irá analisar sua obra no ciclo Cadeira 41, que inicia na terça-feira, dia 1 de agosto às 16h, na Academia Brasileira de Letras. A entrada é franca e as inscrições podems ser feitas pelo link: https://www.even3.com.br/itamar-vieira-junior-fala-sobre-josue-de-castro/

“Setenta e cinco anos após a publicação de “Geografia da Fome”, os breves ensaios que compõem o livro refletem os desafios para a superação da insegurança alimentar e nutricional no Brasil do século 21”, diz ele, que se pergunta como ser concebível que um país com um território vasto, fértil e que colheu cerca de 270 milhões de toneladas de grãos na safra 2021/2022 (1,3 tonelada por habitante) possa ter índices de fome tão alarmantes?

Josué de Castro fez faculdade de medicina na Universidade do Rio de Janeiro e logo foi para os Estados Unidos para um estágio na Universidade de Columbia. Quando voltou ao Recife, abriu uma clínica com uma nova especialidade médica para a época: a nutrição. No consultório, logo percebeu que precisava precisar colocar o pé na rua para entender os problemas nutricionais da população – foi para as fábricas, onde percebeu que a doença que acometia os funcionários era a fome.

“Metade da humanidade não come; e a outra não dorme, com medo da que não come.” (Josué de Castro)

Partindo de sua experiência pessoal, publicou uma extensa obra que inclui: Geografia da fome –que recebeu o Prêmio Jose Verissimo da Academia Brasileira de Letras, Geopolítica da fome, Sete palmos de terra e um caixão e Homens e caranguejos. Nestes escritos, descreve a fome como fenômeno social: “o tema deste livro é a história da descoberta da fome nos meus anos de infância, nos alagados de Recife. Procuro mostrar neste livro de ficção que não foi na Sorbonne nem em qualquer outra universidade sábia que travei conhecimento com o problema da fome. Esta se revelou espontaneamente a meus olhos nos mangues do Capibaribe, nos bairros miseráveis da cidade do Recife, fervilhando de caranguejos e povoada de seres humanos feitos de carne de caranguejos, pensando e sentindo como caranguejos.”

Estas imagens de infância e o exercício da medicina foram fundamentais na trajetória científica de Josué de Castro. Nos idos de 1935, ao coordenar o inquérito sobre as condições de vida da população do Recife, já era evidente que as velhas e insustentáveis teorias, falsas interpretações, deploráveis preconceitos raciais e climáticos precisavam ser substituídos.

Seu livro “Geografia da Fome”, de 1946, é uma obra clássica da ciência brasileira, referência fundamental para a análise dos impactos sociais do subdesenvolvimento.

Nele, Josué realizou um intenso trabalho no sentido de mapear toda a distribuição e concentração da fome no Brasil. O resultado foi a derrubada de alguns mitos: de que a fome decorria de influências climáticas ou de que tal processo era culpa da improdutividade da população que optava pelo ócio, argumentos bastante populares ainda hoje.

“A fome é a expressão biológica de males sociológicos.” (Josué de Castro)

Ele foi pioneiro ao defender a instituição do salário mínimo como garantia de segurança alimentar das famílias. Formulou ainda, para o governo, uma política de merenda escolar com o objetivo de reduzir a subnutrição infantil.

Em Geografia da Fome, divide o território brasileiro em cinco regiões. Em duas delas, há incidência de fome endêmica e nas outras de fome epidêmica.

Na Amazônia, por exemplo, a fome decorria sobretudo da incapacidade do homem de explorar os recursos naturais e também da maneira de exploração imposta na área durante a fase da borracha priorizando a exportação.

O Nordeste úmido foi vítima da colonização que destruiu o ecossistema para substituí-lo pela cultura da cana-de-açúcar, impedindo a produção de alimentos necessários à população.

No sertão semiárido, observa-se que nos anos em que há chuvas normais, a população se alimenta, havendo a ocorrência de fome quando o ano é de seca, a produção agrícola não se realiza, o gado morre e a população é forçada a migrar à procura de alimento.

O pensador não apenas afirmou que havia solução para o problema da fome, mas também apontou caminhos – como, por exemplo, a implantação de políticas de segurança alimentar e a cooperação global.

Concluiu que as camadas situadas na base da pirâmide estavam inferiorizadas porque moravam mal, comiam mal ou não comiam e não tinham acesso aos serviços essenciais.

Seis anos mais tarde, Josué de Castro publica “A Geopolítica da Fome”, onde transfere seu raciocínio para a escala mundial, constatando que o subdesenvolvimento é uma consequência do processo de colonização.

Em 1951, Josué foi eleito presidente do Conselho da Food and Agricultural Organization (FAO), passando a viajar por vários países e visualizar os problemas da fome, sobretudo nos países subdesenvolvidos.

Como presidente da FAO, lançou a campanha mundial contra a fome e propôs a criação de uma reserva mundial, contrariando os interesses de grupos econômicos nacionais e internacionais. Enfrentou forte oposição dos países desenvolvidos à execução de projetos voltados para o desenvolvimento do terceiro mundo.

Em 1962, foi designado embaixador do Brasil na Conferência Internacional de Desenvolvimento, em Genebra, na Suíça. Compreendendo que sua ação a partir daí deveria se fazer no plano internacional, renunciou ao mandato de deputado federal, eleito pelo PDT em 1954.

Em 1964, teve seus direitos cassados, perdendo o cargo de embaixador e se exilou em Paris, onde lecionou na Sorbonne.

Morreu em 1973, no exílio.

Fontes: Brasil Escola, USP (texto de Anna Maria de Castro) Brasildefato, Fundação Perseu Abramo; Teresa Campello, em “A fome e a pobreza”.

28/07/2023

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