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ABL recebe doação rara

 

Biógrafa de Cecilia Meireles, palestrante do Ciclo “Poesia e Biografia” na última terça-feira, dia 18, , a professora Leila Gouvêa fez a doação à ABL de uma obra rara da poetisa, o livro “A Lição do Poema”. Editado pelo Instituto Cultural Ponta Delgada, nos Açores, em 1998, contém 246 cartas de Cecilia Meireles ao poeta açoriano Armando Cortes-Rodrigues, escritas entre janeiro de 1946 e março de 1964. O livro foi organizado pelo professor Celestino Sachet.

Armando Côrtes-Rodrigues afirmou-se como um dos maiores intelectuais açorianos do século XX, deixando uma obra cultural marcante. É recordado na toponímia de Ponta Delgada, cidade onde também existe um espaço de memória e de criação estética, a Morada da Escrita/Casa Armando Côrtes-Rodrigues, um equipamento cultural instalado na última casa onde o escritor habitou. Cortes-Rodrigues foi também um importante ativista cultural, participando em múltiplas iniciativas e instituições.

Cecilia Meireles ficou órfã ainda pequena – o pai morrera três meses antes de seu nascimento. Foi criada pela avó materna, Jacinta Benevides, natural de São Miguel, nos Açores, onde morava Armando Cortes-Rodrigues.

Nas cartas, Cecilia fala de sua vida, suas angústias, amigos, família, escreve poemas e manda partituras de músicas. Em 16 de outubro de 1954, Cecilia diz ao amigo “...o mundo é uma coisa engraçadíssima, visto pelos olhos humanos. Os nossos são poéticos, o que é diferente.”

Anos mais tarde, ela escreve: “ entristece-me pensarem – quase todos – que o que eu escrevo é uma coisa, e eu e a minha vida somos outras. Isso não é exacto.” .. eu não tenho existência humana bem definida, como V. sabe; sou coisa de areia, água, vento, que vem um soprinho dos ares, leva; um calorzinho de sol e se acabou.”

Sobre a avó, a quem dedicou o poema “Elegia”, ela escreve: “Nunca vi criatura assim, de boa, de forte, de terna, de feminina e de masculina. Eu, pode ser que realize alguma coisa na vida, mas o resto são palavras, isto é, a queixa de não poder viver uma beleza total. Minha avó era essa beleza total: de corpo e de espírito. Nenhum arquivo dirá nada a seu respeito. E ninguém senão eu poderá dizer a seu respeito, porque sua vida foi esforçar-se por mim, na crise de saúde e de dinheiro que abateu toda a minha família. Não posso pensar nela sem a ver como um S. Cristovão atravessando a inundação. Quem sabe um dia conversaremos longamente sobre pessoas amadas? Que pena não se poder nada por quem se ama!”

19/07/2023