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O lixo do lixo

 

Na infância catou lixo nas ruas de New Brunswick, no Canadá. Aos 22 anos, comprou um antigo teatro de variedades em Haverhill, Massachusetts. Aos 30 anos, era o maior salário dos EUA". Esta é uma rápida sinopse de um dos magnatas de Hollywood, o semianalfabeto, truculento, lendário e genial Louis B. Mayer, o homem da Metro e daquele leão que ainda hoje ruge num logotipo que rendeu bastante dinheiro.

Pulando de Massachusetts para o Lins de Vasconcelos, comparo o sucesso dele com o meu fracasso.

Não catei lixo pelas ruas. Aos 22 anos, catava notícias e apurava como podia os fatos miúdos do dia a dia naquela que foi a profissão de meu pai e seria a minha. Passados tantos anos, continuo sem compreender o intrigante hiato existente na biografia da maioria dos milionários, Louis B. Mayer entre eles. De catador de lixo na infância, mal saído da adolescência já tinha dinheiro para comprar um teatro.

Talvez o lixo do Canadá seja tão rico e fecundo que dá para esses lances. Aqui no Brasil é diferente, o nosso lixo deve ser ruim mesmo, seus catadores atravessam a vida e morrem na pior. Volta e meia medito sobre as razões que me impediram de ganhar os milhões de dólares que nunca tive. Uma dessas razões, seguramente, é que não catei lixo na minha infância.

Citei o caso de Louis B. Mayer, poderia citar o de Aristóteles Onassis. Esse não catou lixo. Catou pontas de cigarro em Buenos Aires e no final da vida podia pagar cinco noites por ano com a viúva da América, também conhecida como Jacqueline Kennedy. Outro magnata, John D. Rockefeller, não nasceu rico nem dono de poços de petróleo. Em menino, vendia perus que ficaram faltando em minha obscura biografia e na desoladora modéstia de minha conta bancária. (Pedido de um leitor do bairro Peixoto). 

Folha de São Paulo (RJ), 15/09/2015