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O intelectual do ano

 

Não costumo - nem gosto - de escrever sobre livros neste canto de página. Mas não posso deixar sem registro dois dos mais recentes trabalhos de Alberto da Costa e Silva. Durante anos, em que ele como diplomata de carreira morava fora do Brasil, só o conhecia pela sua poesia, sendo ele filho de outro poeta.


Convivendo com Alberto mais estreitamente nos últimos anos, li outros trabalhos seus, até que encarei "Um Rio Chamado Atlântico", de 2003, e agora seu último livro, "Francisco Félix de Souza - Mercador de Escravos", já louvado na semana passada pelo Elio Gaspari.


Dentro daquilo que poderia denominar de "formação cultural", sempre fui ignorante em temas e em coisas da África, com exceção das Guerras Púnicas, que são mais romanas do que cartaginesas. Os dois livros do Alberto me estontearam pela importância que a África tem em nossa história, costumes, atos e fatos. Desconfio que perdi muito tempo com a Europa em geral, com Itália, França e Espanha principalmente. Acho que seria outro homem se procurasse o Brasil do outro lado de um rio chamado Atlântico.


Já havia lido um de seus clássicos, "A Enxada e a Lança", sobre a África antes dos portugueses, vale dizer, antes de outros colonizadores. Os dois livros mais recentes mostram que somos muito mais africanos do que europeus, nas virtudes e nos vícios que assimilamos e, em alguns casos, ampliamos.


O mercador de escravos foi talvez o homem mais rico de seu tempo em todo o mundo. Teve mais de 60 filhos, mas não é exatamente a sua biografia que interessa, e sim o entorno, as relações da África com o Brasil, que geralmente limitamos ao tráfico negreiro e que são bem mais profundas, produzindo-nos como povo e nação.


Alberto da Costa e Silva ganhou o Juca Pato como intelectual do ano. Poucas vezes houve um prêmio tão merecido.


 


Folha de São Paulo (São Paulo - SP) 24/06/2004

Folha de São Paulo (São Paulo - SP), 24/06/2004