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Hospedagem francesa

 

Os franceses são, como é geralmente sabido, muito politizados. Visitei muito a França quando meus sogros viviam e quando, após a morte deles, minha mulher herdou a "villa" e eu continuei, com ela, a usar a residência na Cote d’Azur, a região mais linda, mais atraente do mundo. Conheço, portanto, a doce França, por ter viajado por várias regiões, inclusive as estações de neve, apesar de não esquiar. Estive também nas regiões de vinho, uma das minhas paixões.


Durante minhas visitas, um dos lugares ao qual eu não faltava era o Gabinete de Leitura, que inspirou o imperador Dom Pedro II a criar idênticos estabelecimentos, para ensinar os brasileiros a lerem o mais que puderem para se instruírem. Se importando, que a França de hoje tem duas forças mais ou menos equivalentes. A direita e a esquerda, cada qual com seus partidos ou partido. No caso da esquerda, o Socialista, que deu um presidente de longos anos de reinado, François Mitterand, o florentino, isto é, o maquiavélico.


Essa familiaridade com a grande nação, que deu tantas vozes ilustres ao pensamento e tantas datas históricas, que mudaram a face da terra, me autoriza a argumentar que os franceses sabem ser hospitaleiros, sabem como nenhum outro país hospedar seus convidados. Daí não ter estranhado ao ler sobre a recepção ao presidente Lula. O chefe do governo brasileiro tem, na sua personalidade, todas as notas que agradam principalmente a esquerda francesa, mas também o homem comum da direita. Lula tomou um "bain de foule" na Bastilha, na data histórica da comemoração de sua tomada. Um presidente retirante das soalheiras do Nordeste adusto, pobre, desprezado pelos governos, roubado pelas suas empresas de socorro ou desenvolvimento, esse obstinado lutador chega à Presidência não de uma republiqueta qualquer, para os estrangeiros, mas do Brasil, de 180 milhões de habitantes, prometido a um grande futuro, embora castigado pela corrupção desenfreada nas alturas do poder. Nada, portanto, estranhei. Lula fez bem não faltando à celebração, o que seria aceito, por ser conhecida a tremenda crise política da qual ele é um dos responsáveis.


Os franceses, por seu presidente, Jacques Chirac, pelos ministros do governo e pelas demais autoridades, tudo fizeram para agradar o taurino, de físico, presidente brasileiro. A mídia francesa deu páginas inteiras para o presidente, enaltecendo-o, por um lado, e colocando-o na mira da crise, que atormenta o país, e traz para a rua, a praça, a avenida, a alameda, em suma, para o conhecimento da opinião pública os podres da política brasileira. Cumprindo um dever, deixam de certa maneira mal o presidente, que é argüido de conivente ou inepto, como já fizeram vários políticos em declarações aos meios de imprensa e aos demais meios de comunicação.


Esperamos que Lula aprenda a lição, ou desista de alianças, razões que maculam de nódoas inestirpáveis o seu governo. Ao voltar ao Brasil, como já fez, que procure salvar a face, antes que se perca de uma vez.




Diário do Comércio (São Paulo) 20/07/2005

Diário do Comércio (São Paulo), 20/07/2005