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As enchentes

 

As enchentes são desses assuntos que, entra ano e sai ano, são presentes na vida dos paulistanos desde a chegada dos jesuítas ao planalto predestinado, que é este, onde vivemos.


Lembremo-nos, para justificar o recuo no tempo, que 25 de janeiro, data da fundação de São Paulo, era plena estação chuvosa. Os jesuítas procuraram um lugar alto, para evitar as enchentes, pois o rio Tamanduateí provavelmente havia transbordado, e o escolheram também para se defender de ataques indígenas. São Paulo convive com as enchentes, portanto, há quatrocentos e cinqüenta anos.


Nos artigos publicados na imprensa paulistana, os autores escreveram causas posteriores à da fundação da cidade. O crescimento destaca-se com a impermeabilização do solo, decorrência do desenvolvimento urbano.


De acordo. Nada foi previsto pelos chamados homens públicos, que, entra ano e sai ano, nada fazem de proveitoso para a cidade, visitada periodicamente pelos fenômenos naturais que já os poetas traduzem como cólera da natureza. Tudo o que concorre para aumentar a fúria destruidora das enchentes nós sabemos até demais.


Os titulares de cargos de administração também sabem e melhor do que nós. E o que se faz? Pouco. Uns piscinões, que nada resolvem, algumas canalizações de córregos e outras obras mais ou menos típicas dos engenheiros e seus colaboradores.


As enchentes causam prejuízos enormes aos alcançados por elas. As favelas, que se multiplicaram em torno da capital, invadindo, mesmo, os mananciais de água como os da Serra do Mar. Numerosas casas comerciais perderam parte de estoques e nada podem fazer, senão protestar, e nada poderão fazer, pois antigamente iam se queixar ao bispo e hoje nem os bispos podem dar atenção às queixas e seria inútil perder tempo, mais proveitoso no ensino da doutrina católica, que está esquecida.


As últimas chuvas deram uma visão que só não é a apocalíptica porque essa é o do fim dos tempos. A cólera da natureza dos poetas já está aumentando o seu vigor. Nunca se teve notícia de chuvas tão fortes, com ventos tão violentos com os de há dias. Vieram com esses fenômenos as enchentes e os prejuízos para particulares e empresários, comerciantes, industriais e outros profissionais, que têm de enfrentar as chuvas e suas seqüelas.


Até hoje muito escrevi e muito li sobre enchentes, suas causas e conseqüências, e tenho a certeza de que chegarei ao fim da vida com o mesmo refrão no ouvido. Mas reconheço que é preciso fazer algum trabalho eficaz e definitivo.


A administração municipal que se ocupe desses males, tendo presente que a natureza é poderosíssima. Não temos como enfrentá-la sem risco e sem prejuízo.




Diário do Comércio (São Paulo) 07/06/2005

Diário do Comércio (São Paulo), 07/06/2005