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Einstein e eu

 

Como a bela Inês, cantada por Camões, estava eu posto em sossego quando me convidaram para integrar uma comitiva de escritores que participaria da Feira do Livro de Frankfurt, em outubro do ano passado.

Há tempos, havia recusado o convite de dois queridos amigos meus, Ênio Silveira e o Jorge Zahar, que sempre compareciam àquele evento anual basicamente dedicado a editores de todo o mundo.

Meti-me no avião da Lufthansa e fui parar numa cidade que eu já conhecia e não admirava. Terminado o evento, fui fazer a minha mala que eu pensava estar pesada, cheia de livros que comprara na própria Feira. Acontece que a mala estava vazia, e, ao tirá-la do armário, perdi o equilíbrio e caí para trás, batendo a cabeça no chão de mármore.

Não senti nada na hora, fiz a mala porque viajaria naquela mesma noite. A viagem foi feita normalmente, somente quando cheguei em casa, tive dificuldade de pegar a chave do meu apartamento. Caí outra vez e só despertei na UTI de um hospital aqui perto. Foram dez dias de exames e foi constatado um coágulo de sangue no meu fatigado cérebro. Medicado, o resto do organismo igualmente fatigado absorveu o coágulo.

Seria exagero do destino se eu tivesse uma sequela cerebral, bastava a precariedade daquilo que chamam de massa cinzenta. Me consolei com o exame feito no cérebro de Einstein, que tinha massa cinzenta pior do que a minha.

Acontece que fiquei sem movimento nas pernas e fui catalogado sumariamente como cadeirante. Minha nova situação tem algumas vantagens. Abrem espaços nos aviões, restaurantes e no trânsito em geral.

Se soubesse disso teria batido com a cabeça muito antes da Feira de Frankfurt. Um conselho genérico que dou a todos: pensem em Einstein e em mim mesmo. Verão como a vida fica mais fácil.

Folha de S. Paulo (RJ), 11/11/2014