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Desde a primeira aurora

 

Nejar ou Najar é carpinteiro em árabe. E sou de alguns descendentes rabinos e carpinteiros.

Com o judeu no árabe, sangue entrelaçado. Portanto, sem guerra alguma. Depois na minha família, o irmão de meu pai Sady, era monsenhor.

Um dia percebeu que eu transportava o perigo da poesia e sentiu certa preocupação com meu futuro.

E me aconselhou que abandonasse a poesia, pois não rendia nada. E tinha razão, não rende. A lua, a noite, os pássaros não rendem. Mas o que rende é o que parece que não rende.

Para possuir, é necessário despossuir. Respondi na época, ao meu prático e nobre tio, que ele servia ao mais alto e sublime Poeta do Universo, criador do firmamento coma ponta de seus dedos. O que fazia o Rei Davi reafirmar sua ânsia de “despertar a aurora”.

Mas continuei poeta, amei o Ministério Público do pampa e a Palavra no Ministério das constelações. Reparei, aos poucos, que assim como a poesia, até o desútil, ínfimo tem utilidade e espaços: as formigas ou as águias. Os homens são complicados, Deus é simples.

E o absoluto se esconde na palavra ao ser revelada. Ou se esconde no coração humilde, ávido de luz. Ensina-se de aprender.

Após mais de 50 anos de poesia, num país, que tem assumido o esmagamento da palavra pela imagem ou poder da mídia, alegro-me de ser sobrevivente. Como a memória contém fogo, o esquecimento é cadeia apagada, se não contiver azeite.

Swift, de Gulliver, assegurava que "há pessoas sensatas demais para serem poetas e outras, poetas demais para serem sensatos”.

Ainda que na revelia sustente meu lado levantino de administrador (fui secretário geral e presidente da ABL, no ano de 2000, em que, essa entidade criou uma nova biblioteca, entre as mais modernas, com salas temperadas, sala de vídeo-conferência, computação, livros raros, aberta ao público).

Mas é preciso um pouco de sensatez na loucura e um ponto de loucura na sensatez. O que tende nos ignorar, é o que cada vez mais nos reconhece.

 

A Tribuna (ES), 05/03/2017