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Delação premiada

 

Amigo meu, grande editor da fase moderna da literatura brasileira, fazia tudo para que pudesse entrar no partido comunista. A duras penas, conseguiu ser admitido e recebeu de presente uma ida à então União Soviética. Foi animado, mas voltou decepcionado pelos princípios ideológicos adotados pelo partido oficial e gestor do comunismo internacional.

Numa cidade importante, não tenho certeza se foi em Kiev, encontrou uma estátua de bronze dedicada a um adolescente que delatara às autoridades do Kremlin o próprio pai, o qual foi processado, preso e morto pela polícia do partido, a KGB. Ele deixou de lutar pelos ideais do partido comunista brasileiro. Mesmo assim, pressionado, acabou ficando no partidão apenas por fidelidade aos seus ideais socialistas.

A atual delação adotada pela Operação Lava Jato, mais cedo ou mais tarde, erguerá estátuas àqueles que à Justiça e à polícia entregaram os cúmplices das propinas nojentas dadas a funcionários e empresários, que exigiam dos partidos ligados ao governo os benefícios ilegais que abasteciam políticos isolados ou em grupos, medidas criminosas que desfalcavam o dinheiro do povo.

Como se sabe, aproveita-se a delação, mas despreza-se o delator que não age pelos princípios legais e necessários ao desenvolvimento do Brasil, criando a calamitosa situação que estamos atravessando. Dizem que o fim justifica os meios, máxima fascista e imoral adotada pelos regimes de força que defendem interesses criminosos.

Qualquer um, desde os índios xavantes aos cardeais brasileiros, está sujeito a ser delatado por aqueles que cobiçam o prêmio da inocência ou da diminuição da pena a que foram condenados. Duvida-se de uma causa que usa um recurso indecente para continuar na mesma indecência. 

Folha de São Paulo (RJ), 12/06/2016