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A crise e o culpado

 

Pouco antes de o procurador-geral da República, Augusto Aras, solicitar ao STF — e conseguir — a abertura de inquérito para apurar a conduta de Eduardo Pazuello durante a crise da saúde no Amazonas, o próprio ministro da Saúde embarcava para Manaus para “ficar o tempo que for necessário”, sem previsão de “voo de volta”.

Enquanto isso, movimentos de direita e esquerda saíam às ruas de 18 capitais, apoiando a vacinação e pedindo o impeachment de Bolsonaro, que respondeu com ironia: “Vi uma carreata monstro de uns dez carros”. Na verdade, ele viu mal. Em São Paulo, a fila de carros na Avenida Paulista era de perder de vista e, no Rio, a carreata formava uma fila de quatro quilômetros de automóveis, motos e bicicletas.

Os protestos aconteceram num momento desfavorável para Bolsonaro, em que a sua popularidade está em queda. Duas recentes pesquisas do Datafolha justificam o mau humor que atrapalhou sua visão. Uma aponta o aumento dos descontentes: 40% da população avaliam sua atuação como ruim ou péssima, ao contrário dos 32% da edição anterior da sondagem, no começo de dezembro.

Outra indica que 46% acham que João Doria fez mais contra a pandemia que Bolsonaro. Aliás, o principal inimigo político de Bolsonaro soube faturar a aprovação do uso emergencial da CoronaVac, a vacina que ele sempre defendeu, e Bolsonaro rejeitou, pelo menos até a embaixada chinesa informar que estava enviando os 5.400 litros de insumos.

Quanto a Pazuello, espera-se que nessa sua volta a Manaus ele não tenha levado para distribuir a hidroxicloroquina, o famoso medicamento ineficaz que Bolsonaro costuma receitar. Quem melhor desvendou o seu papel na trama foi Merval Pereira, ao revelar que ele tem tudo para ser o “bode expiatório”.

Pressionado pelos procuradores para tomar alguma providência, Augusto Aras tratou de proteger quem o protegeu. É claro que o general Eduardo Pazuello tem culpa. Mas o responsável é quem o escolheu e o mantém num cargo para o qual não tem a menor condição de ocupar. É o presidente Jair Bolsonaro.

O Globo, 27/01/2021