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A nova esquerda e o bem-estar social

 

A surpreendente vitória da esquerda no Canadá repercute muito além do seu território. Surge no Ocidente, no mais estável dos Estados de bem-estar, e serve de um sinal de abandono de toda visão atual da estabilidade coletiva. Indica, possivelmente, a reação à passagem do conservadorismo ocidental ao fundamentalismo, na busca de um status quo que perdeu a segurança nos seus horizontes. 

É todo o Ocidente que se questiona sobre essa alteração do "fiel da balança", a começar pela própria campanha sucessória nos Estados Unidos. Os apoios de Hillary se interrogam justamente sobre esses novos pontos cardeais de mudança, e a discussão crítica na campanha é exatamente a respeito do que seria a incorporação pelos democratas da temática dos reptos da esquerda e de uma visão crítica do liberalismo econômico. Na Europa, de polarização extrema, esse mesmo status quo só acentua a radicalização da direita de Le Pen, claramente, na defesa de um regime surdo-mudo a toda reforma fiscal ou à redistribuição de renda, na tarefa pública de manutenção da infraestrutura do aparelho econômico. 

O apelo à esquerda cresce, ainda, frente à ruína das esperanças da normalização geral do sistema no seu quadro europeu, diante do quadro drástico de diminuição do emprego, numa aposta das reduções de welfare state. Mas é o lance, num futuro próximo, que cauciona o avanço dessa guinada à antidireita, nas estimativas de largo prazo do crescimento econômico mundial. Se é de 2% a expectativa americana ou de 1,8% a europeia, a expansão chinesa, no próximo quinquênio, se estima em 6,5% a.a. do seu PNB. Significativamente, nesse novo horizonte, à busca de uma racionalização do capitalismo ocidental, começam as novas visões do welfarismo, na redução do que possa, ainda, se manter como um seguro social global ou que garanta o plus de poupança individual. Nessa gama, as limitações dos gastos com a cultura, de par com os da educação superior, ou com o sistema de aposentadorias e amparo à velhice, largam-se do welfarismo do século passado. A aposta vai, ainda, à confiança na acumulação residual, vinda da pré-história da prosperidade, protegida pela ideologia acrítica do bem-estar de há um século.

Jornal do Commercio (RJ), 13/11/2015