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Continuísmo e amadurecimento democrático

 

O presente quadro político latino-americano indica a peculiaridade do amadurecimento democrático do continente, em avanço claramente distinto do Primeiro Mundo. Nessa perspectiva, as eleições representam as buscas periódicas da mudança de maiorias, na decisão política de economias funcionais, envolvendo possíveis alterações do seu desempenho. Entre nós, a manifestação popular cobra, ainda, uma afirmação identitária prévia do país "para si" brotando, de vez, do seu inconsciente coletivo. É nessa mesma dimensão que o voto indicaria a afirmação do país "para si", frente ao vulto da dominação externa, no que a nação emergente vai se afirmar, exorbitando, inclusive, das suas fronteiras. 

O bolivarismo de Chávez, na Venezuela, fez-se do contraponto à dominância da economia americana. O continuísmo dessa perspectiva, com Maduro, nasce da mesma premissa que, hoje, mantém a expectativa de poder de Correa, no Equador. A vigência que pretende Morales, na Bolívia, é a da permanência do primeiro indígena chegado ao governo de La Paz. Avança a vitória de Scioli, na Argentina, revendo uma subsequente nova investidura de Kirchner e traduzindo a vigência profunda do peronismo, em que, pela primeira vez, deparou o país a estrutura de dependência, na amplitude, até então, do colonato internacional. Claro que, na mesma vertente, a permanência do eleitorado de Lula é a dessa mesma toma de consciência, indene ao moralismo. 

No Brasil, tal não se confunde com a possível perda, frente à saída da marginalidade radical, do estrato do petismo que chegou à baixa classe média e que, atingida a mobilidade social, tende a associar-se às reações dos grupos mais favorecidos. Da mesma forma, em compensação, os grupos radicais de esquerda resistem à alternativa da terceira via, agora, de Marina e veem na fidelidade a Lula um "mal menor", diante do novo envolvimento da dominação internacional. 

Por toda a América Latina, ao mesmo tempo, o avanço democrático mostra a remoção dos clássicos e habituais golpes de Estado do passado contra a luta clânica, inseparável do subdesenvolvimento. Mas a nossa maturidade institucional implica, sem tentações regressivas, a passagem das oposições à consciência do confronto identitário, senão pedagógico, que o petismo trouxe à República.

Jornal do Commercio (RJ), 09/10/2015