O principal corte de despesas no orçamento de Obama para enfrentar a crise foi aos US$ 890 bilhões previstos para o meio ambiente. A força dos números diz da consciência imediata que uma condição de crise dá às prioridades de uma política pública da primeira nação do mundo. Não há que repetir a impermeabilidade do bushismo à ecologia marcada pela negação de todo apoio à Conferência de Kyoto e a um primeiro alinhamento internacional quanto as muitas mazelas da terra pela dita civilização das luzes e do progresso.
A vitória do democrata dramatizou o caminho oposto, no chamado inclusive de Al Gore, e do que representava uma temática tão chegada aos corações e mentes vencedoras do pleito presidencial. O corte não criou grande alarde na lua de mel de Obama, na mesma medida da competência de seu secretariado em definir as pressões, sobre o presente, de cuidados tão distintos quanto o de reprimir a poluição do transporte, reordenar a aglomeração urbana ou partir para a luta contra o degelo da calota polar e o aquecimento do planeta nos próximos séculos.
Difeririam por inteiro essas exigências da frente ambiental brasileira, diante de violências como a do desmatamento da Amazônia, a racionalização das políticas e áreas no seu seio ou o reenfoque das reservas indígenas frente ao surto da agroindústria. Em termos de desenvolvimento integrado, a preocupação ecológica é a mais atrasada e ainda, via de regra, não se adequa ao tempo da mudança e aos marcos de seus timings.
A demora da liberação, por exemplo, do aproveitamento das quedas d”água do rio Madeira exemplificam o novo richismo detalhista em que nos arriscamos a fazer do rigor ambiental um caso típico da subcultura da mudança. Abraçamos com ênfase o imperativo numa dimensão recém adquirida da nossa consciência cívica em clara emulação com o requinte dos países desenvolvidos. E mais complexo se torna ainda esse enquadramento único em políticas de urgência máxima, como o elenco das ações do PAC, enquanto se as associam à política indigenista e às novas preservações de nosso habitat.
De toda forma também já vencemos a sacralização do ecúmena no início do governo Lula e uma dimensão crítica da mudança como a da agroindústria marcará jogos novos de poder e influência frente aos poderes da República. Falar de desenvolvimento sustentado é por força também entender as ideologias que o comandam e nelas de uma utilização dos valores ecológicos frente às exigências da justiça social e da redistribuição da renda brasileira.
Dão-se conta as Nações Unidas das ideologias e da força em que o clamor pelo preservacionismo se substitui num ethos cômodo às prioridades duras da mudança. Domina-as o imperativo da redistribuição de renda, num país em que 5% da população detêm 50% da renda nacional. Torna-se cada vez mais contundente a correlação objetiva entre as cruzadas pelo purismo ecológico e a perda de interesse pela luta contra a pobreza e a miséria internacional. Cresceria, em contraposição, a consciência do risco de aumento secular dos centímetros do nível do mar.
No último fórum mundial de Belém continuou o desconhecimento dessa ética básica e prioritária da mudança. E o clima da esquerda, depois das crises globais, não se dá conta ainda do quanto a sideração ambiental atrasa os enfoques das alternativas reais de nosso tempo. O país ambientalmente correto entre nós pode cada vez mais ensurdecer-se à nação dos desmunidos e às prioridades de um aqui e agora do povo de Lula.
Jornal do Brasil (RJ) 18/02/2009
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[1] https://www.academia.org.br/academicos/candido-mendes-de-almeida