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Três cenários para a crise

 

Diante da crise desencadeada pela pandemia da Covid-19, o economista Claudio Porto, fundador da Macroplan, consultoria especializada em análise prospectiva e estratégia, realizou na segunda semana de março sondagem junto a um grupo de 150 pessoas de todo o país, entre eles economistas, sociólogos, cientistas políticos, engenheiros, gestores sênior de empresas pesquisadores e professores de universidades.

O propósito era detectar a percepção sobre a situação da economia e da política brasileiras para este ano. O cruzamento das respostas propiciou à Macroplan a criação de três cenários. No denominado  “A reconquista da normalidade”, o melhor, mas de menor probabilidade, em face da intensidade da crise, o Governo assumiria um comportamento cooperativo como seu novo padrão de relacionamento político-institucional, uma reviravolta surpreendente, mas positiva, no que tem pronta resposta dos principais atores políticos. 

Impactos positivos diretos são produzidos nos graus de acerto, nos níveis de confiança e na melhoria e aceleração das medidas de combate às crises da saúde pública, da economia e das maiores vulnerabilidades sociais.

A melhoria do cenário externo também ajuda. Na visão da Macroplan, aceleram-se a velocidade e intensidade das boas respostas sanitárias e aos estímulos econômicos com propagação global. Como resultado, os impactos da crise na economia brasileira são intensos, mas de duração moderada. O segundo semestre é de ampla recuperação.  

O cenário mais provável é o que foi denominado  “Aos trancos e barrancos”, cuja probabilidade, que era de 35% no inicio da sondagem, passou ao final para 60%, à medida que a situação se agravava.   Esse cenário mostra uma continuidade do Brasil atual. A realidade finalmente se impõe, mas “à brasileira”, como define o estudo, isto é, pela metade, alternando momentos mais ou menos preocupantes. A mudança de comportamento dos principais atores do Governo Federal, o chamado “núcleo duro”, incluindo o próprio presidente Bolsonaro, é apenas temporária.

No princípio mais cooperativo, a previsão da Macroplan é que haverá sucessivas recaídas de confrontação, com resposta semelhante dos políticos. A instabilidade do relacionamento continua como “o novo normal”. Os impactos imediatos são positivos - mas não se sustentam por muito tempo.

Os níveis de confiança se mantém baixos, e as medidas de combate às crises da saúde pública e da economia são insuficientes, deteriorando vulnerabilidades sociais.
Externamente, não há novidades, especialmente no relacionamento com a China, com tensão permanente, que varia apenas nos níveis de ‘esticamento da corda’. Isso ocorreria mesmo com a melhoria do cenário global. Como resultado, os impactos da crise na economia brasileira são intensos e de duração prolongada. 2020 é mais um ano perdido.
 
 O pior cenário, que Claudio Porto considera improvável, é “A marcha da insensatez”. Uma ruptura em relação ao Brasil atual, com uma escalada desenfreada de autoritarismo populista. Os laços de coesão social, já enfraquecidos, se rompem numa espiral ascendente de polarização.

As lideranças mais conservadoras e suas bases de apoio acentuam seu comportamento de confrontação e a tensão crescente – política e social – caminham para tornar-se “o novo normal” com impactos negativos no combate às crises da saúde pública e da economia.

Externamente, a novidade é uma piora progressiva no relacionamento do Brasil com a China, a Europa e alguns países ‘inimigos’ nas Américas. Isso ocorre mesmo com a progressiva melhora do cenário global.

Como consequência, teríamos a saída dos ‘liberais de raiz’ da equipe econômica, fazendo com que os impactos da crise brasileira tornem-se intensos e de duração prolongada, com uma ruptura progressiva nas instituições políticas.

As eleições municipais de 2020 poderiam ser adiadas a pretexto de defesa da saúde pública, enquanto uma minoria ativa da população segue nas ruas pedindo “intervenção militar já”.

O Globo, 22/03/2020