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Retrocesso no Rio

 

Os militares que participam da intervenção na segurança pública do Rio de Janeiro, que termina este mês, estão preocupados com os sinais trocados que o governador eleito Wilson Witzel tem enviado à população.

 Ao mesmo tempo em que coloca a segurança pública como prioridade máxima, aventando até mesmo uma legislação que permita o abate de bandidos armados fora de confrontos, começa a atender pedidos políticos para nomear delegados e comandantes de batalhões, prática que havia sido abolida.

Operacionalmente, com a decisão de extinguir a Secretaria de Segurança, vai desmontar todo o aparato de inteligência conjunto das polícias Civil e Militar, que já vem demonstrando progressos.

Os militares insistem em que a substituição das ações pirotécnicas no campo pela ampliação do sistema de informação tem fornecido pistas para as investigações que propiciaram a redução de crimes. Mas advertem que informação é diferente de investigação, e juntar as duas tarefas prejudica o resultado final.

Houve também, no balanço feito pelos militares,uma maior interação com outras instituições que apoiam a segurança pública no Rio de Janeiro, como as Forças Armadas, a Polícia Rodoviária Federal, a Polícia Federal.

A reestruturação das Polícias Militar e Civil, além da melhorar a auto-estima dos policiais, propiciou o emprego integrado de inteligência. Sem uma Secretaria de Segurança que una as duas polícias, a tendência é outra vez disputarem entre si o protagonismo.

Há exemplos aparentemente singelos que revertem em melhoria das condições de trabalho, como a comemoração do aniversário da Polícia Militar, que fez 109 anos. Há muitos anos não havia uma solenidade na data, por falta de verba e também de ânimo, e vários policiais foram condecorados e receberam elogios pela atuação. De 2007 a 2018, a Polícia Militar do Rio teve nove Comandantes-Gerais, com a interrupção de processos institucionais. 

As reformas de pessoal são fundamentais para o futuro da instituição e do Estado. As que atingem os oficiais precisam de aprovação da Assembléia. Os decretos, que atingem os praças, dependem do futuro governador.

Há uma proposta de que de soldado a subtenente, haverá somente duas promoções por tempo de serviço. As demais terão que ser feitas através de cursos regulares, dando destaque à meritocracia.

A média anual de evasão por ano na Polícia Militar é em torno de 1.500 policiais reformados por tempo de serviço, invalidez e mortes. O Estado nunca apresentou um plano de preenchimento desse efetivo de forma eficiente e eficaz. A compra de carros para recomposição da frota não tem a previsão de manutenção, o que acelera o desgaste da vida útil deles.

 As ações conjuntas, apoiadas por informações de inteligência, tem tido resultados concretos, aumentando, na avaliação dos militares, a sensação de segurança em diversas áreas da cidade. Ações para combater o tráfico de drogas em algumas áreas têm reflexo nos índices de roubo de veículos, de cargas e outros correlatos.

Os militares consideram que “as boas práticas e condutas” adotadas desde o início do ano trazem em conseqüência a redução do índice de criminalidade, como no mês de setembro, quando o latrocínio teve uma queda de 8,3% em comparação ao mesmo mês de setembro do ano passado, e uma queda de 15,4% em relação ao mês de agosto.

 O roubo de carga teve uma redução de aproximadamente 15% em relação ao ano anterior, ficando abaixo de 600 pela primeira vez desde setembro de 2015. Os roubos a estabelecimento comercial tiveram uma redução de 13,6%, seguido pela queda dos roubos de rua (redução de 8,2%), homicídio doloso (redução de 17%) e roubo de veículos (redução de 6%).

Segundo relatório oficial da intervenção, “um dos poucos indicadores que apresentaram resultados desfavoráveis, com uma leve alta, foi o de morte decorrente de intervenção policial”.

Os militares alegam que muitas delas foram ocasionadas por “uma reação insana” dos bandidos, e citam uma operação integrada quando, cercados por 4.200 homens, 20 blindados e 3 aeronaves, “se recusaram a aceitar a rendição oferecida, partindo para um confronto em meio à população civil inocente”.

O trabalho de reorganização das polícias e de métodos de inteligência e investigação conjuntos corre o risco de se perder pela adoção das antigas práticas clientelistas, que dão sinais de retornar. A retórica do novo governador não combina com suas práticas.

O Globo, 08/12/2018